29 agosto, 2006

ENCONTROS

Para Elaine
Cristine Patané

Amiga de alma de criança sofrida como eu
Com sede de mãe que não bate nem destrói
Palavra afiada na pena
Desatada na fala na fome de dizer o que vem
O amor pelo improviso do riso
Um pé forte na academia e o outro na arte e no Laisse fair
Os dois braços grudados no seu homem
Mas o olho no mundo
Nos livros quando deus quiser
Eu encontrei em ti
A dor e o teu cabelo tua sensibilidade de ver no feio o belo
Coisa que não se explica
Um sentimento que vem e fica que vai e vem
Meninas de amar o pai e matar a mãe
Eu mais
Ladies de outubro de desejos primaveris
Crianças de libra de dúvidas balanças
Sofrer ou prazer? Eis a canção
Não há dor que não se expresse
Nem todo calor aquece
O frio e a sombra disputam com a luz uma teta
O suficiente é nada
Quando equilibradas parecem águas paradas
Nada mais tediosos do que o equilíbrio o ponto zero
Encontra na tempestade as ondas que deseja
Que esta seja eu ou tu não interessa
Junto com a semelhança procuro também a diferença Posted by Picasa

27 agosto, 2006

Emily, a estranha

Essa é uma gateira particular. Emily, a estranha. Não esperem conhecer uma garota qualquer. Posted by Picasa

DIÁLOGOS


DESENCONTRÁRIOS
PAULO LEMINSKY

Mandei a palavra rimar,
ela não me obedeceu.
Falou em mar,
em céu,
em rosa,
em grego,
em silêncio,
em prosa.
Parecia fora de si,
a sílaba silenciosa.
Mandei a frase sonhar,
e ela se foi num labirinto.
Fazer poesia,
eu sinto,
apenas isso.
Dar ordens a um exército,
para conquistar um império extinto.

Orgias
ELAINE

Orgias poéticas

Profanam o silêncio

Co-sagrando as palavras

Co-sangrando a métrica

Co-rompendo a saga

Kama sutra de rimas

26 agosto, 2006

NOMES E CANÇÕES 2

Mais nomes de gatos:

Tem a Valdemar Cristina da Catarina, que é uma gata, lentinha como era o motorista dela quando criança, o Valdemar, daí juntou com Cristina por que ela é menina.

Tem o Ótimo e o Máximo da Denize, que faz bolsas e sapatos que são um arraso.

Tem a Hilda da Ticia, por causa da Hilda Hirscht.

Tem o Boni do Dé, por que mora na José Bonifácio que foi encontrado no bric, na mesma rua.

Tem a Lygia e o Averbuck (in memurium), que apareçaram na escola da Naia, que tem esse nome e ela os adotou.

Tem o Prensky do Biru, gato traumatizado, mas hoje encontrou um lar, que não sei a origem do nome.

E a cançaõ?

Negro gato
(Getúlio Cortes)

Eu sou um negro gato de arrepiar
Essa minha história é mesmo de amargar
Só mesmo de um telhado, aos outros desacato
Eu sou um negro gato
Minha triste história, vou lhes contar
E depois de ouvi-la, sei que vão chorar
Há tempos que eu não sei o que é um bom prato
Eu sou um negro gato
Sete vidas tenho, para viver
Sete chances tenho, para vencer
Mas se não comer, acabo num buraco
Eu sou um negro gato
Um dia lá no morro, pobre de mim
Queriam a minha pele, para tamborim
Apavorado desapareci no mato
Eu sou um negro gato
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NOMES E CANÇÕES

Nomes de gatos Ágata e Tábata: são as minhas donas, donas da minha casa, (a Tabata é a viajante da foto).
Tem bruxinha na área!

Mia: tem duas Mia, da Fa e da Katia, nenhuma delas mia. Que fenômeno.

O Mousse e o Quindim da Marisa. Estão de dieta.

A Gabriela do Alex, fez uma cirurgia, virou Gabriel.

O Pilatis, da Fe, in memorium.

Iuri, o primeiro homem a pisar na lua e meu primeiro gatinho falecido. A Cajuja, por que eu era e sou fã do Cazuza, in memorium.


Título: História de uma gata
(Enriquez/Bardotti - versão: Chico Buarque)

Me alimentaram
Me acariciaram
Me aliciaram
Me acostumaram
O meu mundo era o apartamento
Detefon, almofada e trato
Todo dia filé-mignon
Ou mesmo um bom filé... de gato
Me diziam todo momento
Fique em casa, não tome vento
Mas é duro ficar na sua
Quando à luz da lua
Tantos gatos pela rua
Toda a noite vão cantando assim
Nós, gatos, já nascemos pobres
Porém, já nascemos livres
Senhor, senhora, senhorio
Felino, não reconhecerás
De manhã eu voltei pra casa
Fui barrada na portaria
Sem filé e sem almofada
Por causa da cantoria
Mas agora o meu dia-a-dia
É no meio da gataria
Pela rua virando lata
Eu sou mais eu, mais gata
Numa louca serenata
Que de noite sai cantando assim
Nós, gatos, já nascemos pobres
Porém, já nascemos livres
Senhor, senhora, senhorio
Felino, não reconhecerás

24 agosto, 2006

ELAS ESTÃO CHEGANDO!


Nessa época do ano, em Santa Catarina, as baleias francas param para se reproduzir. Normal é estar caminhando pela beira da praia e avistar esses animais maravilhosos. As baleias sempre povoaram meus sonhos de criança. Que bom que elas existem para podermos admirá-las. Bem vindas!

TE CONTEI?


Na revista Época de julho saiu uma reportagem sobre os Blogs e saibam que estamos na onda das comunicações e que blog é um super marketing hoje em dia.
Daí tem a querida e maravilhosa Margarida Inventada (margaridainventada.blogspot.com) que vem fazendo minha inclusão no mundo bloguistico e adotou esse humilde blog para dar uma turbinada. Visitem a Margarida, ela apareceu, não fez mal nenhum para o cravo, como aquela rosa horrorosa, e está na janela mostrando um mundo bem bacana para quem quiser ver.
Alguém te liga e diz: adivinha quem está falando? Tu diz que é alguém (esperavas um telefonema). Falam duas horas. O papo é meio surreal, mas, enfim, tu tentas desligar, mas a coisa vai se enrolando. A boa educação, a curiosidade e a carência te mantem na linha. No outro dia cai a ficha: a pessoa não disse o nome, nem o dela, nem o teu. Era um estranho, um trote, um tarado, um desocupado invadindo o teu tempo.

22 agosto, 2006

DIZÍVEIS AMORES

Eles se encontraram no restaurante do hotel. A janela tinha visão para o Guaíba. Quando ele perguntou por que ela o havia procurado de novo, ela lhe respondeu que queria que ele fizesse parte de sua vida de alguma maneira. Anos depois, ele voltou, agora muito fragilizado por uma doença. Ela não teve dúvidas. Ficou próxima dele o quanto ele aceitou. E eles puderam ser autênticos e estar juntos como nunca. Ele foi embora de novo e ela ficou feliz de ter dito aquilo no dia do almoço, anos antes.
Outro restaurante, outro amor de sua vida. Ele consegue se aproximar. Ele senta. Conversam, contam coisas engraçadas, se escutam, se olham. Ela já sabia que isso ia acontecer. Os amores não devem ser expulsos de nossa vida. Somente re-significados. Dessa vez ela não precisou falar nada. Acredita que os dois saibam que serão eternos.

GERÚNDIO

Já repararam a invasão de gerúndios nos tele-marketing e em todos esses serviços de banco, net, e outras burocracias pseudo-facilitadoras cliente e neutralizadoras da subjetividade em geral? A gente manda os caras à puta que os pariu e eles dizem: senhora fulana de tal, vamos estar lhe informando, vamos estar lhe ligando, vamos estar lhe telefonando... coitados, robôs do desemprego. É a nossa língua se dobrando à sintaxe amaricana.
Minha Pátria é minha língua, não vou querer estar falando num português inglesado. SOCORRO!

21 agosto, 2006

DIÁLOGOS

Por que a gente escreve se não para tentar traduzir-se, re-criar-se? Recrear, brincar, criar de novo. Cada vez em que me encontro na confusão em que me meti, é de novo um manto novo do ser. Uma versão que revela o que vela. E se sinto dor, canto e se sinto beleza, esparramo. Ferreira Gullar, Fernando Pessoa e a minha pessoa, por que quando estou só, tenho tantos para dialogar.
Traduzir-se
(Ferreira Gullar)

Uma parte de mim
É todo mundo
Outra parte é ninguém;
Fundo sem fundo

Uma parte de mim
é multidão:
outra parte é estranheza
e solidão

Uma parte de mim
Pesa, pondera:
Outra parte
Delira

Uma parte de mim
Almoça e janta:
Outra parte
Se espanta.

Uma parte de mim
É permanente:
Outra parte
Se sabe de repente

Uma parte de mim
É só vertigem
Outra parte
Linguagem.

Traduzir uma parte
Na outra parte
Que é uma questão
De vida ou morte
Será arte?

Tudo que sinto, tudo quanto penso
(Fernando Pessoa)

Tudo que sinto, tudo quanto penso, sem que eu o queira se me converteu numa vasta planície, um vago extenço onde há só nada sob o nulo céu.
Não existo senão para saber que não existo, e, como a recordar, vejo boiar a inércia do meu ser no meu ser sem inércia, inútil mar.
Sargaço fluído de uma hora incerta, quem me dará que o tenha por visão? Nada, nem o que tolda a descoberta como o saber que existe o coração.
O EU
(Elaine)

O
EU
ESTE
SER
EM
TRANS
FORMA
AÇÃO

20 agosto, 2006

CAMPEÃO DA AMÉRICA

Eu adorei ver o Inter campeão. É uma sensação de vitória e é isso que o futebol tem de louco. A gente nem faz nada e se sente participando e sendo recompensado. Mas, o que mais rolou para mim, foi lembrar de uma sensação que eu tinha quando ia no estádio com meu pai. O Beira-Rio cheio, eu ao seu lado, me sentindo totalmente protegida e aquela almofadinha com o símbolo do inter, eu achava tri bacana. Era tão legal ver meu pai feliz. Queria ver a cara dele agora! Foi isso que lembrei com essa vitória. Depois, velhinho, lembro do pai conversando com o Robi, meu parceiro da época... e aí, como foi o jogo? Ele já não tinha muito assunto, mas quando ele falava do Inter, o olho azul dele brilhava.
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O ENIGMA DE KASPAR HAUSER


Esse filme de Werner Herzog, que passa em 1828, quando um rapaz que aos 15 anos, criado em cativeiro é solto e largado em praça pública, sem explicação.Ele não sabia falar, nem andar e tinha suas percepções alteradas, enxergava diferente, escutava diferente. Esse filme me faz pensar muito nas crianças com que trabalho, em que medida os humanos que as criaram foram capazes de lhes oferecer o mundo e possibilitar que se desenvolvessem como os supostos normais? No prólogo do filme, uma frase do Kaspar:
"Vocês não ouvem os assustadores gritos ao nosso redor que habitualmente chamamos de silêncio?"
Vocês não ouvem? Eu ouço!

Elaine

NATAL

Quando eu era pequena nem sabia direito o que era Natal. Na pré adolescência descobri que no Natal as pessoas ganhavam presentes, faziam festa e o Bristol e o Baltimore, os cinemas do bairro, fechavam. Eu e meus amigos andávamos pelo Bom Fim meio de cara por que não tinha nada para se fazer. Quando saí do contexto família/escola, comecei a frequëntar as festas de Natal dos meus amigos e conheci a expressão: Nesse Natal, adote um pardal. Depois, a casa dos namorados e finalmente a dos maridos. Coincidentemente, talvez por uma sina, os namoros e casamentos sempre acabaram no final do ano. No Natal passado, fizemos a festa dos sem família, e nos adotamos. Entre meus amigos ateus, eu sou a única judia, mas o negócio é que a gente se sentiu na liberdade de criar nossa própria família. Nesse ano, com ou sem namorado, com ou sem marido, com ou sem religião, a família já decidiu: passamos o Natal juntos.
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18 agosto, 2006

O BEIJO

Beijar pode ser uma arte ou, pode ser simplesmente fazer arte. Pode ser uma passagem, pode ser um instante eterno e terno, pode ser um vascilo e até tarefa de gincana.
Nesse verão encontrei o "meu primeiro beijo". Ele era na época um guri magro, alto e cabeludo. Mas, quem encontrei era um cara meio gordinho e careca, que dizia se lembrar de mim da praia. Eu disse que achava que ele devia ser de alguma parte da turma da praia que eu convivia pouco e que, sentia muito, mas não lembrava dele. Depois, falando com a irmã desse senhor, os neurônios conectaram, as relações foram feitas e lembrei. Lembrei do olho puxadinho dele e do seu apelido. Queria voltar e dizer, nunca esqueci de ti, nunca esqueci daquele carnaval em que tive a coragem de sentada no meio do salão, passar a noite inteira ensaiando aquilo que é uma das maiores delícias da vida: beijar na boca. Não me lembrava do cara, até por que já era outro e não aquele que beijei. Mas, também, nunca me esquecerei dele. Fiquei tomada de uma ternura enorme e por isso escrevo essa confissão. Foi muito bom, a cada beijo, meu presente.
Elaine (foto tirada da escultura: O beijo de Rodin, no museu do próprio)
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16 agosto, 2006

CASAMENTOS

Sou super favorável a casamentos. Acho que todo mundo deveria casar e fazer uma festa de arromba. Festa que nem a da filha da Maria Cristina, a Antonela. Festa chique, com música boa rolando ao vivo, convocando a todas tribos fazerem sua dança. Festa chique, com remédio pré-porre no banheiro para os convidados. Ah, isso eu achei muito chique. Um convite ao desfrute de boa bebida e de alegria. Mas, o mais chique é o contrato que se fez entre os convidados, família e noivos: depois da festa, ninguém lembra de nada, isso é, não há day after. Isso é um luxo!

Elaine
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12 agosto, 2006

A MOÇA TECELÃ

A Moça Tecelã
Marina Colasanti
Acordava ainda no escuro, como se ouvisse o sol chegando atrás das beiradas da noite. E logo sentava-se ao tear.Linha clara, para começar o dia. Delicado traço cor da luz, que ela ia passando entre os fios estendidos, enquanto lá fora a claridade da manhã desenhava o horizonte.
Depois lãs mais vivas, quentes lãs iam tecendo hora a hora, em longo tapete que nunca acabava.Se era forte demais o sol, e no jardim pendiam as pétalas, a moça colocava na lançadeira grossos fios cinzentos do algodão mais felpudo. Em breve, na penumbra trazida pelas nuvens, escolhia um fio de prata, que em pontos longos rebordava sobre o tecido. Leve, a chuva vinha cumprimentá-la à janela.Mas se durante muitos dias o vento e o frio brigavam com as folhas e espantavam os pássaros, bastava a moça tecer com seus belos fios dourados, para que o sol voltasse a acalmar a natureza.Assim, jogando a lançadeira de um lado para outro e batendo os grandes pentes do tear para frente e para trás, a moça passava os seus dias.Nada lhe faltava. Na hora da fome tecia um lindo peixe, com cuidado de escamas. E eis que o peixe estava na mesa, pronto para ser comido. Se sede vinha, suave era a lã cor de leite que entremeava o tapete. E à noite, depois de lançar seu fio de escuridão, dormia tranqüila.Tecer era tudo o que fazia. Tecer era tudo o que queria fazer.Mas tecendo e tecendo, ela própria trouxe o tempo em que se sentiu sozinha, e pela primeira vez pensou em como seria bom ter um marido ao lado.Não esperou o dia seguinte. Com capricho de quem tenta uma coisa nunca conhecida, começou a entremear no tapete as lãs e as cores que lhe dariam companhia. E aos poucos seu desejo foi aparecendo, chapéu emplumado, rosto barbado, corpo aprumado, sapato engraxado. Estava justamente acabando de entremear o último fio da ponto dos sapatos, quando bateram à porta.Nem precisou abrir. O moço meteu a mão na maçaneta, tirou o chapéu de pluma, e foi entrando em sua vida.Aquela noite, deitada no ombro dele, a moça pensou nos lindos filhos que teceria para aumentar ainda mais a sua felicidade.E feliz foi, durante algum tempo. Mas se o homem tinha pensado em filhos, logo os esqueceu. Porque tinha descoberto o poder do tear, em nada mais pensou a não ser nas coisas todas que ele poderia lhe dar.— Uma casa melhor é necessária — disse para a mulher. E parecia justo, agora que eram dois. Exigiu que escolhesse as mais belas lãs cor de tijolo, fios verdes para os batentes, e pressa para a casa acontecer.Mas pronta a casa, já não lhe pareceu suficiente.— Para que ter casa, se podemos ter palácio? — perguntou. Sem querer resposta imediatamente ordenou que fosse de pedra com arremates em prata.
Dias e dias, semanas e meses trabalhou a moça tecendo tetos e portas, e pátios e escadas, e salas e poços. A neve caía lá fora, e ela não tinha tempo para chamar o sol. A noite chegava, e ela não tinha tempo para arrematar o dia. Tecia e entristecia, enquanto sem parar batiam os pentes acompanhando o ritmo da lançadeira.Afinal o palácio ficou pronto. E entre tantos cômodos, o marido escolheu para ela e seu tear o mais alto quarto da mais alta torre.— É para que ninguém saiba do tapete — ele disse. E antes de trancar a porta à chave, advertiu: — Faltam as estrebarias. E não se esqueça dos cavalos!Sem descanso tecia a mulher os caprichos do marido, enchendo o palácio de luxos, os cofres de moedas, as salas de criados. Tecer era tudo o que fazia. Tecer era tudo o que queria fazer.E tecendo, ela própria trouxe o tempo em que sua tristeza lhe pareceu maior que o palácio com todos os seus tesouros. E pela primeira vez pensou em como seria bom estar sozinha de novo.Só esperou anoitecer. Levantou-se enquanto o marido dormia sonhando com novas exigências. E descalça, para não fazer barulho, subiu a longa escada da torre, sentou-se ao tear.
Desta vez não precisou escolher linha nenhuma. Segurou a lançadeira ao contrário, e jogando-a veloz de um lado para o outro, começou a desfazer seu tecido. Desteceu os cavalos, as carruagens, as estrebarias, os jardins. Depois desteceu os criados e o palácio e todas as maravilhas que continha. E novamente se viu na sua casa pequena e sorriu para o jardim além da janela.
A noite acabava quando o marido estranhando a cama dura, acordou, e, espantado, olhou em volta. Não teve tempo de se levantar. Ela já desfazia o desenho escuro dos sapatos, e ele viu seus pés desaparecendo, sumindo as pernas. Rápido, o nada subiu-lhe pelo corpo, tomou o peito aprumado, o emplumado chapéu.
Então, como se ouvisse a chegada do sol, a moça escolheu uma linha clara. E foi passando-a devagar entre os fios, delicado traço de luz, que a manhã repetiu na linha do horizonte.

D(EX)PEDIDA

ia cada vez mais
embora
embora nem tivesse partido
do meu coração
partido
já havia se ido
Elaine Posted by Picasa

11 agosto, 2006

BEE SEASON


Posted by Picasa Às vezes alguns filmes são surpreendentes. Olhei esse. Tirei por que ver o Richard Gere é sempre um colírio. Eu sei que é um critério fútil, mas é honesto. O tema é sobre a tradição da letra na cultura judaica, principalmente pela Cabala. O quanto a letra nos inscreve no mundo e pode nos aproximar do poder da existência. Um dos seminários mais importantes de Lacan chama-se a Instância da letra no inconsciente... Não é à toa.

Bem, a menina do filme, faz papel de filha da bela Julliete Binoche e tem o dom de soletrar. O pai é um estudioso da Cabala e começa a ensiná-la o poder da escrita e a relação de poder possível da grafia das letras e de seus sons. A tradição judaica é simbólica, interpretativa. Os salmos, os provérbios, as metáforas e os chistes, são dessa família. Bom seria se pudesse se usar isso como anti-bombas nas guerras entre Israel e Líbano... por que não se pode lidar com isso simbolicamente? Bem, a questão do filme é que há um excesso do pai. Estranho, numa época que se fala da falência da função paterna, da falta dessa figura. Sei lá, o filme deixou coisas a pensar, por isso já valeu. Um detalhe bacana, deixando o comentário ainda mais caótico, é que numa hora fica claro que a letra é mantra e o mantra é letra, acho que tudo tem relação, a gente que conhece pouco.

Elaine

BELA BELO

O primeiro cd da Belo é esse. Eu estava em Santa Tereza, no Rio, entrei numa lojinha e escutei tocando uma voz maravilhosa, uma melodia deliciosa. De quem é esse som? Da Belo Veloso. Se é genético, ou se é algo de uma inscrição pela via dos tios , o Caetano e a Bethânia, pouco importa. Como também não importa se a Maria Rita imita a mãe, ou se ela se identifica com ela (que bela mãe para se identificar). O que vale é que é muito gostoso, viciante, tem encantamento. A moça tem um talento como o do tio, ela faz releituras de músicas bregas que ficam lindas. Esses dias ouvi uma do Peninha na rádio. Não sei de qual cd, mas o som me capturou e quando a locutora anuncia, é ela: Belo. Bela Belo, há dez anos na estrada, bem menos tempo na minha vida. Antes tarde do que nunca.
 Posted by Picasa

10 agosto, 2006

RECEITA DE FEIJOADA

Pensa, domingo de inverno, acordar e ter uma feijoada te esperando. Na feijoada tem o Sadi tocando cavaquinho com outros sambistas da antiga. Acrescenta os amigos que tão sempre lá, começando pelo Pio, camalêonico proprietário do local: o Zelig.
Junta novos velhos amigos e aniversário de um deles. Rega com um bom vinho tinto. É de dar água na boca. Só no sapatinho!

Elaine
 Posted by Picasa

08 agosto, 2006

A LUA CHEIA DEU NA CARA DELA

Posted by Picasa A LUA CHEIA DEU NA MINHA CARA
Elaine
Olhei pro céu
procurei a lua
como faziam
os antigos:
gregos
egípcios
homens
primitivos
como faço todo dia,
abro a janela
como faço toda noite,
em busca dela

olhei pro céu

procurei a lua

como faço
com me'amor
por onde ele ande
por onde ele anda?
no céu
na tribo
n'aldeia
n'água que
passou na areia

quando ele brigou comigo


vi a lua e seu efeito
ela está cheia!
e a cada lua cheia
também enche
meu céu
meu mar
meu peito
E é o que tenho a dizer
a respeito

A LUA CHEIA DEU NA CARA DELA
Elisa Lucinda
Hoje perdi a palavra O contato com ela
O amor calou-me a boca. O amor boicotou de mim
Minha própria informação
Os planos se espatifaram contra os móveis de minha própria casa
A ação, derretida manteiga,
mela o tapete (não deve ser nada sério)
apenas tenho impotentes vontades
como a de quebrar essa merda desse telefone
que está sendo pago para alvoroçar meu coração.
Pago por mim.
Eu financio essa tortura
De não ser nunca tua voz no outro lado da linha.
Que linha móvel indecifrável que me pendura
E compromete meu ser ao I Ching infame da Telerj?
Hoje perdi a palavra.
A língua me renuncia.
O amor me empanturrou a fala
Mas eu não vou me comover.
Há um ladrão que me saqueou a alma Afanou-me o senso
Atordoou-me a calma
Mas eu não vou denunciar (não deve ser nada sério)
apenas dormi acordada
e abri as portas
quando estavam sendo arrombadas.
Os danos estão à mostra
E o ladrão diz que não houve nada.
Apenas a lua me fura os olhos e eu sou derramada
Hoje perdi a palavra.
Hoje perdi o som da minha própria caligrafia,
O trabalho sensual das minhas consoantes
Adiante perdi a estrada que ia dar
Na minha própria cozinha
Na minha, estou calada (não deve ser nada sério)
Apenas o amor chegou na hora inesperada
E deparou com máscaras gelatinosas
na minha cara Bobs nos cabelos
Tranqüilizantes sobre a saga

(hoje é peixes e afogamentos e, dizem, março, 14, 1987)

07 agosto, 2006

ZOOLÓGICO

desenho feito por Pamela, julho de 2006.
No café nosso de cada dia, rola o papo entre o Alexandre (da semiótica) e o Tiago (da arquitetura):

Zoô

lógico

?

Par

que

?
por: Elaine
Posted by Picasa

MACH POINT


Sabe aquele momento crucial? Aquele segundo em que tudo se define, e apesar de ser tão fulgaz, por ser só um segundo mesmo, a gente sabe que dali prá frente tudo muda? Um olhar, com uma expressão que nunca tinha sido vista, acompanhado por uma leve abertura de boca, e de repente surge um rosto que passa a ser de um desconhecido. Mas, eu nunca vi esse rosto... mas, é o mesmo que o da pessoa que eu amava? Não, não é igual, é semelhante. A sombrancelha levemente erguida, o olho d'agua e o fato desse novo rosto mostrar versões dessa pessoa, que nunca foram reveladas levam ao mach point. Estranhamento: me enganei, fui enganada? Como no genial filme do Woody Alen, a bolinha suspensa no ar e só pode cair para um dos lados. É o ponto final. Nova linha, parágrafo. Então, outros textos, novos rumos, até que...mach point!
por: Elaine
Posted by Picasa

06 agosto, 2006

Cidades invísiveis

Um trecho de um livro que muita gente acha chato, mas eu acho maravilhoso... de Ítalo Calvino

Marco Polo descreve uma ponte pedra sobre pedra.
- Mas qual a pedra que sustenta aponte? pergunta Kublai Khan
- A ponte não é sustentada por esta ou aquela pedra- responde Marco, mas pela curva que estas formam.
Kublai Khan permanece em silêncio refletindo. Depois acrescenta:
- Porque falar das pedras? Só o arco me interessa.
- Polo responde:
- Sem pedras o arco não existe.

As cidades invisíveis, Ítalo Calvino

Recreio

 

Sentada na frente do computador, (melhor seria em cima, no calorzinho, pensa Ágata), fazendo um power (alucinado) point, entre teorias, fujo pro recreio(pão com recheio com mil brincadeiras no meio, disse a criança do Urbim prá minha).
Encontro com Barthes e ele me diz, lá da sua Aula, que "Essa trapaça salutar, essa esquiva, esse logro magnífico que permite ouvir a língua fora do poder, no esplendor de uma revolução permanente, a chamo quanto a mim: literatura."


Mais uma dose? É claro que tô a fim!

Encontro com Spinoza, diretamente do século XVII(mais antigo e não menos vivo que Barthes)

La única libertad posible se realiza a
través del conocimiento de las propias
pasiones.

E assim, me apaixono, pela e através da palavra.

Elaine, domingo nublê Posted by Picasa

05 agosto, 2006

Amor ao livro

Também sou apaixonada por livros e nunca pensei que ler blogs ou qualquer leitura de tela pudesse substituir o papel. Gosto de livros bonitos. Se a capa for linda, então, já me chama a atenção. O último da Elisa Lucinda tá uma belezura, parece um livro romântico antiguinho. Adoro os cheiros, as texturas. Gosto de ler marcando, para depois ler as marcas, refazer os caminhos. Minhas pilhas de livro têm classificações (invisíveis, só eu que sei). Tem os que gostaria de ler, começo e nunca continuo(amo Proust e nunca li um livro inteiro dele). Tem os que releio sempre por pedaços, como os do Barthes e do Nietzsche, e os de poesia que eu amo.
Tem os de contos, que adoro por que posso ir pulando sem culpa. Mas, quem já leu O prazer do texto(Barthes) é excomungado de qualquer culpa por qualquer forma de leitura. Odeio ler manuais, embora ache que seria inteligente lê-los. Me dou conta que fico analfabeta para ler instruções em novas linguagens, como a desse blog, cheio de siglas e nomes que não significam nada para mim. Já li coisas difíceis como Lacan e Joyce. Fui leitora de gibi, de Monteiro Lobato, de fotonovela e de Recreio. Agora tenho minha pilha cheia de delícias: Cortazar, Caio Fernando, Elisa, Arnaldo, Lispector. Gosto de ir comendo aos poucos, saboreando, leio anarquicamente. Agora, paro tudo para eu ler minhas teorias e preparar minhas aulas e pensar no meu trabalho: que é a leitura e escrita das crianças. E não tô fazendo isso? Então? Acho que ler é ter fome com os olhos, ter apetite de alma, é querer se jogar no Outro(o outro da linguagem). Adoro ler livros marcados por pessoas que eu amo. Adoro ler suas marcas, o que escolheram para destacar, o que lhes imprimiu algo no espirito, ou na subjetividade. Sempre quero ler o que meus amores lêem. Me sinto compartilhando e aprendendo seu mundo. Amo os livros, suas cores, texturas, cheiros, formatos, capas, folhas, letras, adoro sua alma e o bem que ela me faz. Gosto de ser atravessada pela beleza da palavra escrita, de ser transformada, remarcada por ela. Gosto da escritura no papel por que nela vamos e voltamos, lemos e relemos, para nos inscrever no texto, para sermos re-escritos por ele.

PAROLES

PAGE D’ÉCRITURE
Jacques Prévert

Deux et deux quatre
quatre et quatre huit
huit et huit font seize...
Répetez! Dit le maitre
deux et deux quatre
quatre et quatre huit
huit et huit font seize.
Mais voilà l’oiseau-lyre qui passé dans le ciel
l’ nfant le voit
l’efant léntend
l’efant l’apelle:
Sauve-moi
Joue avec moi
oiseau!
Alor l’oiseau descend
et joue avec l’enfant
Deux et deux quatre…
Répetez! dit le maitre
et le’nfant joue
l’oieseau joue avec lui…
Quatre et quatre huit
huit et huit font seize
et seize qu’est-ce qu’ils font?
Ils ne font rien seize et seize
et surtout pas trente-deux
de toute façon
et ils s’en vont.
Et l’enfant a caché l’oiseau
dans son pupitre
et tous les enfants
entendent la musique
et huit et huit à leur tour s’en vont
et quatre et quatre et deux et deux
leurvtour fichent le camp
et un et um ne font ni une ni deux
un à un s’ent vont également.
et l’oiseau -lyre joue
et le enfant chante
et le professeur crie:
Quand vous aurez fini de faire pitre!
Mais tous les autres enfants
écoutent la musique
et les murs de la classe
s’écroulent tranquillement.
Et es vitres redeviennent sable
l’encre redevient eau
ls pupitres redeviennent arbres
la craie redevient falaise

le porte-plume redevient oiseau.

04 agosto, 2006

Ao pé da letra

Ao pé da letra

Este turbilhão
de vozes

se anunciando
se inscrevendo
se contra-dizendo
num jogo de pegação

às vezes
ao pé da letra

Elas se escrevem
denunciando-nos
pela polissemia
à qual estamos imersos
adormecidos
sendo navegados

Elaine

To voltando prá casa

Prá alegria geral, mas geral mesmo, essa semana está voltando de sua temporada de dois anos em Puerto Escondido, um grande amor da minha vida (afilhado, sobrinho, amigão) e da vida de muita gente.
O Lucas pegou todas ondas, nesse super paraíso, ajudou a construir um hospital com um médico xamã (quem mandou dar para ele ler Carlos Castaneda?).
Sou sua maior fã e se querem nos deixar orgulhosos é dizer que somos parecidos.
Bem vindo!

03 agosto, 2006

Tudo quanto penso


Tudo quanto penso,
Tudo quanto sou
É um deserto imenso
Onde nem eu estou.
Extensão parada
Sem nada a estar ali,
Areia peneirada
Vou dar-lhe a ferroada
Da vida que vivi.
[...]
Fernando Pessoa, 18-3-1935

02 agosto, 2006

O caminho de Theo

PRO MEU PRIMO NEI E SEU FILHO, MEU PRIMO THEO.

O caminho de Theo

Seu nome ia ser Zig, por que seu pai o adorava desde que ele era um zigoto.
Falava com ele na barriga antes dele tomar rumo ao mundo.
Mas, nasceu, se chamou Theo e cresceu.
Era dia de viagem para o sítio e lá se foram de jipe
O pai na frente, o Theoo atrás.
Mal entraram no carro, perguntou o Theo:
- Falta muito, pai?
O pai olhou para cima e disse:
- Olha o azul do céu!
Saíram da cidade e de novo:
- Falta muito, pai?
Ele respondeu:
- Olha o verde do morro!
Curva vai, curva vem:
- Falta muito, pai?
O pai sorriu e disse:
- Olha Theo, o rio que tem!
E passaram pelas vacas,
- Falta muito, pai?
E passaram pelo campo,
- Falta muito, pai?
E o pai ia mostrando cada detalhe, cada canto.
- Falta muito, pai?
- Não, Theo, já chegamos!
- Vamos voltar pai?
- Mas, Theo, tu não querias tanto chegar?
- Pai, é que eu gosto tanto do caminho!
Seu pai sorriu e lhe fez um carinho.

Elaine

01 agosto, 2006

Gatos e gateiros


Têm alguns gateiros famosos: O Ferreira Gullar, que tem um "Gato chamado Gatinho" e fez um livro infantil com esse nome. O Gatinho é a cara da Tábata, essa aí de cima, de rabo arrepiado. Também parece com a Ágata. Mas elas são irmãs siamesas, só podiam ser parecidas.
Tem o T. S. Eliot, que acho que pouca gente sabe (quem me contou foi o Celso, que é um poeta prá lá de bem informado) que a peça The Cats é fruto de um livro dele, escrito para crianças. E se transformou nesse sucesso, que nunca sai de cartaz em Nova York. O livro eu tive, emprestei, não me devolveram. Um desses traumas que a gente demora a se recuperar.
Depois tem os gatófilos amigos: O Pio, a Cacau, a Ticcia, a Kátia, o Dé, A Elenice, o Iran, a Fe, a Angélica, a Fátima, o Langone e o Pedrinho, o Nilvo, que levou os gatos de Brasília até Nairobi!
Nesses dias frios, as minhas gatas viram bolinhas enroscadas no edredon. Da cama para o armário, esse é o intinerário. Quem não queria ser gato nesse frio arredio? Eu queria!

Elaine

Psia e psiu



PSIA
Arnaldo Antunes

FEMININO DE PSIU

Na minha

Na minha
Elaine

Passei o dia com o fogo
Como o fogo
O dia com a chuva
Como a água

Fiquei no silêncio
e seus tons
no silêncio e seus sons

um menino que nunca viu uma árvore
o vazio e seus lugares
vazio vácuo
vazio borda
transborda
de novo

passei o dia com o fogo
como o fogo
suas labaredas coloridas
queimando por baixo
papel
graveto
tora
chama
brasa
cinza
e seus tons
a chuva
e seus sons

fogo e silêncio

fogo
ar
árvore
água
imagem
som
passei o dia
na minha
e meus tons.

Amor quase

Amor quase
Elaine
A cama queimava
a pele
nua em pelo
ardia
(Se ao menos tu me tocasse)

Mas
só de sentir teus pelos
roçando de leve
pelo meu corpo
doía

O lençol imundo
cheirava à esquecimento
O edredon suava
meu apagamento.

Sem lugar
sem teus braços
nem teus beijos
nem teu pau
que me acariasse
passei intrusa

Meus peitos inchados pela lua
doíam desprotegidos
em mim nada calava
nem a noite
nem a saga

Teus votos des-amor
me sufocaram

De manhã
murchaste em mim
(irrigávamos nosso amor quase)

Escorrendo entre detalhes
palavras tapa furos
não me aliviaram

Amar é maltratar
no aperto feio do pai
na boca suja da mãe
no descaso cego do amante

Me retirei num protesto
que faço em poesia
Amor, eu não quero cego
Meu amor,
quero potência
Teu amor,
evolução
Se me queres intensidade
Te quero comunhão